quinta-feira, 28 de junho de 2007

Lanterna vermelha

As alterações climáticas não serão o fim da espécie ou da civilização humana. Mas o mesmo não se poderá dizer em relação a alguns países. E mesmo Portugal, longe de sumir, vai estar dependente da maior ou menor capacidade de adaptação. E para isso há que contar com dinheiro e com as pessoas. Apesar disso, a maioria dos portugueses, nestas coisas de aquecimento global, nem sequer sabe daquilo que se trata e o que está em causa. Isso mesmo mostrou um inquérito feito pelo semanário Expresso no Verão de 2001. Então, quase 60 por cento dos portugueses não soube identificar de forma correcta a causa do aquecimento global – a libertação de dióxido de carbono e gases com efeitos semelhantes. Quase 40 por cento pensavam estar relacionado com o buraco do ozono e quatro por cento escolheram mesmo uma resposta tipo “ratoeira”: o excesso de estufas. Estes resultados chegaram a ser piores do que os obtidos por um inquérito do projecto Observa efectuado um ano antes.

De qualquer modo, conceitos e conhecimentos ambientais à parte, há algo que é do senso comum: poluir significa desperdiçar, sobretudo quando o crescimento económico atinge níveis tão baixos que nem pode servir de compensação. Veja-se então como Portugal tem evoluído nos últimos tempos em termos económicos e de desperdício. Basta comparar, a nível europeu, alguns indicadores energéticos – por exemplo, a eficiência energética na União Europeia melhorou 10 por centos nos anos 90 e em Portugal piorou 10 por cento – e de desenvolvimento para constatar que o nosso país é de extremos. Somos o campeão europeu no crescimento da poluição atmosférica e apenas a Grécia teima em não nos deixar assumir a liderança do subdesenvolvimento económico na União Europeia. Apesar das inúmeras oportunidades que os fundos comunitários nos trouxeram, o produto interno bruto per capita de Portugal continua a afastar-se da média da União Europeia.

Os sucessivos governos são pródigos em divulgar números e percentagens. Mas nestas coisas, as percentagens levam-nos, por vezes, a erros de “paralaxe estatística”. Mesmo sabendo-se que Portugal registou um aumento do produto interno bruto, estandardizado ao poder de compra, da ordem dos 38 por cento entre 1995 e 2001 – que permitiu que passássemos de um valor de 70 por cento da média comunitária para os 74 por cento, durante aquele período –, na verdade afastámo-nos dos mais ricos países europeus. Se olharmos para os números em termos absolutos verifica-se que em 1995 estávamos a 5200 euros do valor médio de produto interno bruto per capita da União Europeia. Em 2001, essa diferença tinha crescido para os 6100 euros. Chegámos, aliás, à desconfortável situação de um dos futuros Estados da União Europeia, Chipre, nos ultrapassar em termos de performance económica. E esta fraca evolução não é apenas conjuntural. É estrutural. É um claro sintoma de desperdício.

Voltando ainda à componente económica – é necessário para depois confrontar com a evolução dos gastos energéticos –, Portugal tem a mais desequilibrada balança comercial da União Europeia. Em 2001, por cada euro de produtos que exportámos, necessitámos de importar produtos no valor de 1,6 euros. Desde 1997 esse desequilíbrio agravou-se em 12 por cento. As relações com Espanha – o nosso principal parceiro comercial – chegam a ser ainda mais desfavoráveis: actualmente é cerca de 5 mil milhões de euros de saldo favorável aos nossos vizinhos, cerca do dobro do valor de 1995.

Apesar disso, Portugal vive como se fosse um país desafogado. Existem agora 50 por cento mais automóveis que em 1995; a venda de gasolinas e de gasóleo cresceu mais de 60 por cento durante os anos 90; os transportes públicos foram substituídos pelo automóvel em todas as deslocações; os consumos de energia eléctrica aumentaram 30 por cento nos últimos cinco anos; e temos uma das mais altas taxas mundiais de telemóveis. Enfim, somos bons a consumir. Melhor seria que fossemos bons a produzir.

Mas não. A produtividade nacional nos diversos sectores é uma lástima dentro da União Europeia. Na agricultura situa-se nos 29 por cento da média comunitária, na indústria atinge os 44 por cento, nos transportes e comunicações 57 por cento, nos serviços financeiros e de negócios alcança somente os 53 por cento e nos outros serviços 62 por cento. Globalmente, cada português produziu, em média no ano de 2001, apenas 22.200 euros – menos de 4500 contos, na moeda antiga –, ou seja, apenas 46 por cento da média da União Europeia. E, neste caso, estamos mesmo atrás da Grécia.

O sector industrial, motor de qualquer economia, anda quase a passo de caracol. Os últimos dados do Eurostat apontam para um crescimento médio anual do valor acrescentado bruto na indústria nacional da ordem dos 2,7 por cento entre 1997 e 2001. Mas parece que estivemos a produzir para o vazio, pois para a satisfação do consumo interno temos de recorrer, cada vez mais, ao estrangeiro.

Mesmo nos poucos sectores industriais com saldo positivo na balança comercial – pasta de papel, madeiras e cortiça, tabaco, têxteis, calçado e produtos minerais não metálicos (cerâmicas, pedra e cimento) – estamos ao longo dos últimos anos a decrescer as exportações se comparadas com as importações de idênticos produtos. Nos produtos alimentares e tecnológicos, a evolução ainda é mais fraca; as compras ao exterior não têm parado de crescer. Na indústria alimentar, a relação exportação versus importação era de 2,2 no ano 2000, enquanto três anos antes era de 1,9; um agravamento de 15 por cento em tão curto espaço de tempo. É este o triste fado de um país outrora agrícola que não se soube adaptar aos novos rumos da Política Agrícola Comum. Não deixa de ser curioso que a agricultura – responsável por 12 por cento das emissões nacionais de gases de efeito de estufa, por causa sobretudo do metano da pecuária e arrozais – foi o único sector que em Portugal registou um decréscimo na actividade poluente. Somos assim a ex-União Soviética da agricultura europeia: deixamos de poluir porque o sector está num processo de abandono. No seu último relatório económico do Eurostat, esta instituição comunitária salienta mesmo que o valor acrescentado bruto do sector agrícola português registou um decréscimo médio anual da ordem dos 2,3 por cento entre 1997 e 2001.

De resto, a situação nacional, em termos económicos, só não é pior porque a construção e os serviços financeiros tiveram crescimentos significativos: entre 1997 e 2001, os respectivos valores acrescentados brutos aumentaram 5,2 por cento e 8,1 por cento por ano. Provavelmente, foi este o erro. Os fundos comunitários e a época favorável na conjuntura económica mundial foram “desperdiçados” sobretudo em betão, asfalto e em empréstimos bancários...

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